sexta-feira, 20 de março de 2009

1 CONFERÊNCIA ESPIRITUALIDADE: MEU LEGADO NA FAMÍLIA E NA SOCIEDADE

"O que a maioria das pessoas precisa não é mais conhecimento da fé, mas determinação espiritual para pôr em prática o que já conhece, não importando quais sejam as consequências".

Os puritanos herdaram o foco na vida oculta como esfera das devoções familiares e também a ênfase monástica no silêncio medieval. Com certeza, o silêncio é um ingrediente da vida oculta. Mas eles também herdaram da Reforma uma consciência do auto-engano intrínseco ao ser humano natural. O puritano Thomas Brooks deixou-nos um clássico sobre essa disciplina ambígua em The Mute Christian Under the Smarting Rod [O cristão mudo debaixo da chibata da aflição] (1659). Seu pensamento central estava em Salmos 39.9: "Emudeço, não abro os meus lábios porque tu fizeste isso", ele começa a nos advertir de que somos "a maior cilada para nós mesmos". Em seguida, alista vários falsos motivos para o silêncio, incluindo estoicismo, motivações políticas, mau humor e desesperança. Por outro lado, observa que o verdadeiro silêncio baseia-se na graça e na santidade, mantendo Deus sempre em vista. As sete qualidades do silêncio piedoso são estas:

  1. Reconhecemos a presença de Deus mesmo no meio das aflições.

  2. Quando passamos a compreender um pouco a santidade de Deus, obedecemos ao mandamento "Cala-te diante do SENHOR Deus" (Sf 1.7).

  3. Com um pouco mais de experiência da graça de Deus, submetemo-nos e descansamos nele em paz, sem jamais responsabilizá-lo por nossas aflições e declarando "Bem sei, ó SENHOR, que os teus juízos são justos".

  4. Aumenta a certeza de que "todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus" (Rm 8.28). Isso nos ajuda a confiar profundamente, deixando em suas mãos todos os resultados.

  5. Sempre nos lembramos de que não é do caráter de Deus afligir-nos sem necessidade; trata-se de sua "obra estranha" (Is 28.21).

  6. Torna-se mais fácil atender à ordem de Deus: "Descansa no SENHOR e espera nele" (Sl 37.7).

  7. Por fim, esse silêncio baseado na sabedoria e na confiança diante de Deus fica impregnado de sua presença, de modo que nos submetemos e renunciamos a nós mesmos, entregando-nos espontaneamente às suas cheias de graça, sussurrando: "Fala, SENHOR, porque o teu servo ouve" (1Sm 3.9).

Enquanto isso acontece, deixamos para trás as cidades iluminadas para nos embrenhar no deserto e apreciar o céu numa noite estrelada. Também aprendemos a cultivar o silêncio e a solitude, a fim de obter uma visão mais clara do caráter e dos caminhos de Deus, pois ainda vemos através de um vidro escuro. A vida interior é ainda o que T. S. Eliot chamou de vereda de "observância, disciplina, pensamento e ação. O indício meio previsto, a dádiva meio compreendida.

Uma existência unicamente exterior tende a levar a vida por opiniões e posturas de terceiros que nunca assimilamos em nível pessoal no coração. Em vez disso, precisamos da atitude de Maria, escondendo no coração a Palavra viva para que por ela sejamos fecundados. Em lugar de viver na circunferência social das exterioridades, precisamos das profundezas ocultas de uma vida centrada, aprendendo a distinguir entre o interior e o exterior, entre Deus e o mundo, entre o Espírito Santo e o nosso espírito. Precisamos até questionar a interioridades, para discernir o Espírito de Deus de nosso temperamento e descrição, conforme insinuou Thomas Brooks.

sexta-feira, 13 de março de 2009

CONHECIMENTO APLICADO! (Parte I)


“Quem precisa de teologia?”. Penso que percorrer um pouco mais sobre este assunto será valioso, visto ser relevante vermos que é possível atrelarmos o conhecimento à prática.

Por esta razão, antes de iniciar a subida de nossa montanha, precisamos parar e fazer a nós mesmos uma pergunta fundamental – pergunta que, na verdade, devemos fazer sempre que nos dispusermos a estudar qualquer assunto na Palavra de Deus. Essa questão diz respeito a nossos motivos e intenções como estudantes. É preciso indagar de nós mesmos: Qual o alvo final e a razão de eu estar ocupando a mente com estas coisas? Que pretendo fazer com o conhecimento de Deus que vou adquirir? Pois o fato que teremos de enfrentar é este: A busca por conhecimento teológico como um fim em si mesmo talvez nos prejudique, tornando-nos orgulhosos e convencidos. A própria magnitude do assunto nos embriagará e chegaremos a pensar que somos bem melhores e superiores aos demais cristãos dado nosso interesse no assunto e a compreensão dele. Olharemos com superioridade para aqueles cujas idéias teológicas nos pareçam rudes e inadequadas, pondo-as de lado com desprezo. Isso se conforma às palavras de Paulo aos presunçosos cristãos de Corinto: "O conhecimento traz orgulho [...] Quem pensa conhecer alguma coisa ainda não conhece como deveria" (1Co 8.1 b,2).

Preocupar-se em adquirir conhecimento teológico como um fim em si mesmo, aproximar-se da Bíblia para estudá-la sem nenhum motivo além do desejo de saber todas as respostas é o caminho direto para o auto-engano complacente. Precisamos proteger o coração contra essa atitude e orar para que isso não aconteça.

Como já vimos antes, não pode haver saúde espiritual sem conhecer a doutrina, mas é igualmente verdadeiro que ela não será alcançada com esse conhecimento, se for buscado com propósitos errados e avaliado segundo padrões falsos. Deste modo o estudo da doutrina pode se tornar um perigo para a vida espiritual; e nós hoje precisamos estar atentos a esse respeito, tanto quanto os antigos coríntios.

"Mas", diz alguém, "não é um fato que o amor à verdade revelada de Deus e o desejo de saber o máximo sobre isso é normal em toda pessoa que tenha nascido de novo?". Veja o salmo 119: "Ensina-me os teus decretos", "Abre os meus olhos para que eu veja as maravilhas da tua lei", "Como eu amo a tua lei!", "Como são doces para o meu paladar as tuas palavras! Mais que o mel para a minha boca!", "dá-me discernimento para compreender os teus testemunhos" (v. 12b, 18,97a ,103,125).

Não é verdade que, assim como o salmista, todo filho de Deus quer conhecer o máximo possível a respeito de seu Pai Celestial? Não é, na verdade, o fato de termos recebido "o amor à verdade" uma prova de que nascemos de novo? (v. 2Ts 2:10). E também não é justo que procuremos satisfazer ao máximo esse desejo dado pelo próprio Deus?

Sim, naturalmente que sim. Mas se você se reportar ao salmo 119 verá que o interesse do salmista em obter conhecimento de Deus não era teórico, mas prático. Seu desejo supremo era conhecer e comprazer-se no próprio Deus, e considerava esse conhecimento de Deus um simples meio para alcançar um fim. Ele queria entender a verdade divina a fim de que seu coração pudesse corresponder a essa verdade e viver de acordo com aa. Observe a ênfase dada nos primeiros versículos:
  1. "Como são felizes os que andam em caminhos irrepreensíveis, que vivem conforme a lei do Senhor! Como são felizes os que obedecem aos seus estatutos e de todo o coração o buscam! [...] Quem dera fossem firmados os meus caminhos na obediência aos teus decretos" (v. 1,2,5).
Ele estava interessado na verdade e na ortodoxia, nos ensinamentos bíblicos e teológicos não como um fim em si mesmos, mas como meios práticos de aperfeiçoamento da vida e de santidade. Sua preocupação maior estava em conhecer e servir o grande Deus, cuja verdade procurava entender.Esta deve ser também nossa atitude. Ao estudar a divindade, nosso alvo deve ser conhecer melhor ao próprio Deus. Nosso objetivo deve ser expandir nosso conhecimento não apenas da doutrina dos atributos de Deus, mas também do Deus vivo a quem pertencem esses atributos. Já que ele é o tema de nosso estudo e nosso ajudador nesta tarefa, deve ser também o fim em si mesmo. Ao estudarmos Deus, devemos procurar ser conduzidos a ele. A revelação nos foi dada com esse propósito, e devemos usá-la com essa finalidade.
Dr. Ricardo Reis
Reitor da FEB